Re: [Cyprinodontiformes] ELB... vamos lá ver se nos entendemos !

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Sexta-Feira, 19 de Junho de 2009 - 15:04:03 WEST


A definição de espécie hoje tem pouco a ver com a definição de espécie do
século passado.

De facto, actualmente aceita-se não apenas que uma espécie se possa cruzar
com outra e produzir exemplares férteis como também que o mesmo possa
acontecer até caso do GÉNERO...

Por exemplo, géneros distintos de ciclideos do Malawi podem cruzar-se entre
si e produzir exemplares férteis: o caso dos cruzamentos entre os géneros
Pseudotropheus, Maylandia, Cynotilapia, Melanochomis, Petrotilapia ... etc.

A espécie é uma classificação inventada por nós, humanos e nem sempre
consistente: a natureza prova-nos constantemente que este é um conceito
artificial.

As coisas até se complicaram com o advento da análise genética: dois
elementos de uma mesma espécie podem ter entre si maior percentagem de
variação de DNA do que dois elementos de espécies diferentes. Tudo depende
de onde é diferente e não, em termos de percentagem genética, em quanto é
diferente.

Penso que as discussões nesta área são inúteis e mesmo um tanto ou quando
disparatadas.

É evidente que o conceito de espécie é artificial, tendo sido durante
demasiadas décadas apadrinhado por naturalistas obtusos, como forma de ter
as suas colecções devidamente organizadas nos museus ou nos compêndios.

O rei vai nu.

Diferenças no gonópodio? E depois? Não se cruzam e não produzem descendência
fértil? À semelhança claro, de muitas outras espécies e mesmo géneros
reconhecidos :)

Vejamos, se, na espécie humana, fossemos seguir alguns dos principios que
têm sido usados na classificação de espécies, seriamos quantas espécies?

Compare-se o gonopódio de um Nigeriano com o de um Japonês... :)

Mas, entre nós, também há diferenças na pelagem, na coloração, na estatura,
no formato dos olhos, proporções dos membros, etc, etc. Colocando um pigmeu
congolês ao lado de um nórdico, nenhum biólogo marciano os consideraria uma
mesma espécie.

Mas isto não quer dizer que, apesar de oncompleta e nem sempre consistente,
a ideia de "espécie" seja um disparate.

Pelo contrário, trata-se de um conceito útil, faz parte da nossa estrutura
de pensamento chamar nomes às coisas. É preciso haver a unidade biológica
"especie" mesmo que este seja um conceito flexível.

A "espécie" é o que nos permite identificar grupos parecidos de individuos,
atribuindo-lhes estatuto, reconhecendo formalmente a sua existência.

É algo que nos ajuda a pensar, quanto mais interesse e importância damos à
biodiversidade mais espécies reconheceremos.

Tal como os Esquimós que, no seu mundo, consideram essencial ter mais de
duzentas palavras para "gelo", então para compreendermos, processarmos,
apreciarmos e preservarmos toda a espantosa diversidade da vida, precisamos
de espécies.

Isto significa tornar um grupo de seres vivos importante. Dar-lhes
visibilidade, no mundo dos humanos.

É claro que esta classificação, para ser credível, deve ter um mínimo de
regulação e critério mas há claramente uma opção explícita, do cientista ou
cientistas em questão,  reconhecendo a importância de um determinado
conjunto de seres vivos.

Torna-se muito útil usar espécies para descrever a incrível variedade do
Lago Malawi assim como é útil existir a espécie "Poecilia wingei" para
descrever a claramente distinta população da Laguna de Patos.

Há dois efeitos perversos aqui:

1- Quem não compreende que "Espécie" é um conceito artificial e flexível,
baseando em factos reais mas que se destina sobretudo a representar no mundo
dos humanos um determinado grupo de seres vivos, pode perder-se em
interminaveis discussões e debates.

2- A espécie é um nome, como tal não deve mudar! O que aconteceria se nós
estivessemos sempre a mudar de nome? Há espécies que já tiveram mais de uma
dúzia de nomes diferentes...

Isto é precisamente o contrário do pretendido por Lineu: haver um nome ÚNICO
e universalmente reconhecido.

O nome de uma espécie não deveria depender da classificação subjacente, como
o género.

Deveria ser um nome único e imutável, independente da classificação
taxonómica.

De facto, deveria até ser possível uma mesma espécie poder constar em
diferentes sistemas de classificação.

"Espécie" deve ser sinónimo de ID único, intransmissível e intemporal.

A grande mudança a fazer é: O primeiro acto de se reconhecer uma espécie não
pode estar dependente de se saber como esta se encaixa na árvore taxonómica.


Imagine-se a primeira vez que um cientista encontra um Hipopótamo em África:
Não pode esperar para saber que o bicharoco é aparentado com os golfinhos
(algo que só se concluiu mais de 100 anos depois) para então lhe dar um nome
cientifico...

Primeiro apercebemo-nos que estamos perante um grupo de seres vivos novo,
que não integrado, em termos de regras humanas, em nenhum outro ID que já
reconhecido.

Então baptizamo-lo.

Só mais tarde vamos procurar saber quem é a família.

É assim que as coisas deviam funcionar. É assim que nós, humanos,
funcionamos.

Os nomes têm que ser independentes de classificações.

Miguel


2009/6/16 <cyprinodontiformes  viviparos.com>

> [ENG] Dear members,
>
> If you need an English version of this topic, other than the usual machine
> generated conversion, please let me know via viviparos  viviparos.com.
> Thanks in advance.
>
> Miguel
>
>
>
> [POR] Prezados colegas,
>
> Tenho vindo a receber insistentemente algumas mensagens, especialmente do
> Brasil mas também de Portugal ( e uma até de Angola ), solicitando-me ajuda
> sobre o Endler.
> Sobretudo da Holanda, Bélgica e República Checa chegaram igualmente algumas
> contestações em relação à ficha destinada à espécie Poecilia wingei, no meu
> sítio na Internet ( http://www.viviparos.com/Fichas/Endler.htm ).
> A crítica menos comum mas a mais correcta de todas é relativa à foto dessa
> mesma ficha, a qual ilustra um híbrido e não um exemplar genuíno.
> Quanto a esta última questão só tenho a pedir desculpas aos meus leitores
> pela preguiça de substituir a dita imagem, o que de facto não abona muito a
> minha pessoa.
> Já em relação aos conteúdos há de facto um esclarecimento importante que
> tardo em prestar.
> O que é afinal o Endler ?
> Para alguns, como o Paulo Alves, utente desta lista, o Endler será apenas
> um
> mero Guppy ( Poecilia reticulata ) ou, quando muito, uma subespécie dessa
> espécie e nada mais.
> Para outros, incluindo alguns contestados cientistas como o Dr. Poeser...
> trata-se de uma nova espécie.
> Mas antes de percebermos do que estamos a falar deixem-me definir bem os
> conceitos.
> Não vou hoje dar-vos a minha noção de espécie, mas procurarei tornar
> público
> o meu entendimento pessoal sobre o Endler, atribuindo sobretudo nomes às
> populações para vos divulgar a minha posição sobre o assunto.
> Tenho estado, de há um tempo a esta parte, a denominar o Endler como Cumaná
> ( Alexander & Brenden, 2004 ), Campoma c.q. Poecilia ( Acanthophacelus )
> wingei ( Poeser, Kempkes & Isbruecker, 2005 ) e Puerto la Cruz ( Slaboch,
> 2001 )... conforme a proveniência em questão.
> E aqui começam os problemas a sério.
> Senão vejamos...
>
> 1. Cumaná; subdividem-se, na minha opinião, em três possibilidades :
>
> a) Endler Original
>
> Como Endler Original, entenda-se a linhagem que descende dos peixes
> capturados, em 1975, pelo Prof. John A. Endler na Laguna de Patos ( Cumaná
> ), entregues a Donn Eric Rosen para a respectiva descrição científica e
> herdados ( devido ao falecimento deste ) por Klaus Kallman do Aquário de
> Nova Iorque - " New York Aquarium ", sendo atribuída a este último a
> responsabilidade pela introdução desta linhagem nos circuitos comerciais.
> Este peixe havia sido capturado pela primeira vez em 1937, pelo Dr.
> Franklyn
> Bond, o qual depositou o primeiro exemplar no Museu de Zoologia da
> Universidade de Michigan, onde permanece conservado.
> Esta é a estirpe original de grande parte dos híbridos existentes no
> comércio da aquariofilia e ainda hoje vendidos como " puros " em Portugal,
> no Brasil e em muitos outros países do mundo.
> Os que nesta linhagem se distinguem morfologicamente do Guppy ( Poecilia
> reticulata )  são raros e geralmente não estão à venda no comércio.
> São habitualmente trocados entre aquariófilos com a designação Endler barra
> negra original Classe P ( de acordo com o sistema de classificação da ERU -
> " Endler are Us " - http://www.endlersr.us/ ).
> Em resumo, os descendentes da LINHAGEM ORIGINAL Cumaná ( capturada em 1975
> )
> resultam actualmente nos já raros barra negra " classe P " ( designação
> aplicada a qualquer peixe cuja origem seja desconhecida mas que se enquadre
> nas características fisionómicas, dimensões e coloração dos animais
> originais capturados na natureza ) e à maioria dos comuns " classe K " (
> qualquer híbrido ).
>
> b) Endler " selvagem " ( ou dito puro )
>
> Como Endler " selvagem ", entenda-se todo e qualquer Endler ( e respectiva
> descendência ), capturado após 1975, que se possa provar ser original de
> águas nativas, sendo por essa razão incluído na " Classe N " do sistema de
> classificação da ERU - " Endler are Us " - http://www.endlersr.us/.
> Aqui se enquadram os peixes mantidos em cativeiro de acordo com linhagens
> de
> distintas estirpes originais, as quais foram sendo encontradas no mesmo
> corpo de água ou noutros, mas não muito distantes entre si, com destaque
> para a Lagoa dos Patos em Cumaná.
> Quase todas estas linhagens apresentam uma clara divergência morfológica em
> relação ao Guppy.
> Mesmo considerando o polimorfismo da espécie, até os mais críticos da
> classificação da espécie Poecilia wingei, podem ficar perplexos com certas
> diferenças, nomeadamente ao nível do gonopódio.
> Outra notável dissemelhança é o tamanho total entre os adultos de ambas as
> espécies.
> Mas uma das razões mais fortes que me levam a acreditar que se trata de uma
> espécie à parte é o facto de Cumaná ( classe P mas sobretudo N ), ao
> contrário de todas as outras populações conhecidas de Poecilia reticulata,
> confronta-nos muitas vezes com nascimentos intercalados ao longo de vários
> dias ou semanas... como nas espécies que desenvolveram processos de
> superfetação.
>
> c) Híbridos naturais
>
> Os híbridos " selvagens " são peixes capturados na natureza que apresentam
> as mesmas características dos peixes obtidos pelo cruzamento entre o Endler
> e o Guppy.
> Na Lagoa dos Patos e noutros locais de Cumaná, capturaram-se, sobretudo
> mais
> recentemente, cada vez maiores quantidades destes híbridos.
> Os relatos de expedições ao local confirmam essa tendência.
> No início do ano passado, uma expedição da Asociación Acuaristas de
> Venezuela ( http://www.acuaristasdevenezuela.com  ) deslocou-se  a  Cumaná
> tendo confirmado o total fracasso para capturar outra coisa que não uns
> raríssimos híbridos, ( muito mais parecidos com o Guppy do que com aqueles
> que se designam como Endler classe K ).
> Da Venezuela chegam notícias de uma provável " extinção " dos Cumaná na
> Lagoa dos Patos, atribuindo-se à introdução da Tilápia Vermelha (
> Oreochromis mossambica var red ) o desaparecimento destes peixes, o que
> levou a Associação dedicada ao Endler em Espanha ( Club Endler
> http://www.clubendler.es ) a enviar algumas matrizes de pelo menos duas
> estirpes aos aquariofilistas Venezuelanos.
> Os híbridos e a sua expansão levaram mesmo o Dr. Poeser a escrever que o
> Endler teria sido introduzido em Cumaná a partir das populações de Poecilia
> wingei encontradas na região da Península de Pária, mais de 100 quilómetros
> a oriente.
> O que é facto é que em Cumaná e arredores existem populações naturais de
> Poecilia reticulata.
> Embora o Guppy procure um tipo de ecossistema ( em relação à temperatura,
> salinidade, turbidez e movimento da água ), há locais onde se encontraram e
> capturaram ambas as espécies, mas não se acharam vestígios de híbridos.
> Noutros pontos de confluência os híbridos eram mais abundantes do que os
> exemplares " puros " de ambas as espécies.
>
>
> 2. Campoma ( Poecilia wingei )
>
> Como Campoma designarei os Endler " selvagens ", isto é, todo e qualquer
> indivíduo ( e respectiva descendência ), capturado na natureza que se possa
> provar ser original de águas nativas da Lagoa Buena Vista e Lagoa Campoma
> ou
> áreas limítrofes da Península de Pária, sendo por essa razão, de acordo com
> o meu entendimento, incluídos igualmente no equivalente à " Classe N " dos
> Cumaná.
> Os Campoma desta região da Venezuela, situada a 150 quilómetros a oriente
> de
> Cumaná, numa zona isolada por montanhas estão na base do artigo de
> descrição
> da espécie Poecilia wingei.
> São ainda actualmente muito raros na aquariofilia e apresentam várias
> estirpes diferentes das conhecidas com origem em Cumaná.
> Infelizmente, apesar dos meus esforços, nunca me fizeram chegar um macho
> preservado em álcool para eu poder analisá-lo, ao microscópio, e poder
> dessa
> forma chegar a alguma conclusão.
> Os mais radicais ( sobretudo na Holanda ) admitem que estes peixes sejam
> mesmo diferentes dos designados por mim como Cumaná.
> Não existem criadores conhecidos na Península Ibérica, pelo que não me
> alongarei por mais comentários excepto a expressão « wait and see », ou
> melhor, « ver para querer, como São Tomé ».
> Só depois de ter um exemplar como referência poderei atestar as diferenças
> em relação ao Guppy ou mesmo em relação ao Cumaná.
>
>
> 3. Puerto la Cruz
>
> Os peixes desta população são para mim um completo mistério.
> Foram colhidos apenas 15 exemplares pelo Dr. Roman Slaboch, um biólogo
> Checo, o qual encontrou, em 2001, uma nova população de Endler numa lagoa
> poluída a 1 quilómetro de distância de Puerto la Cruz, na praia Colorada (
> 10.23462 N; 64.62082 W ), ou seja, a mais de 100 quilómetros a ocidente de
> Cumaná e a mais de 250 quilómetros de Campoma na mesma direcção.
> As únicas imagens fidedignas destes peixes encontram-se num artigo do
> próprio autor em
> http://www.akvarium.cz/1899/pages/text/recent/slaboch/venezuela/v2/v2.htm,
> e
> num sítio Japonês em
> http://endlerslivebearer.fc2web.com/notes/locality.htm.
> Neste último há um óptimo mapa com as três localizações referidas
> anteriormente.
> O que é curioso é que na última foto que ilustra um macho Puerto la Cruz, a
> imagem mostra-nos claramente aquilo que seria identificado facilmente como
> um híbrido natural Cumaná.
> Já nas fotos deste outro sítio -
> http://homepage2.nifty.com/endlers/my_endler_(12)eplc.html atribui-se a
> origem dos peixes aí ilustrados como sendo Puerto la Cruz, quando esta
> estirpe poderia ser perfeitamente confundida com a comum Cumaná " classe P
> ".
> Tenciono pois encetar contactos com o Dr. Roman Slaboch em breve, pois
> tenho
> o seu endereço de correio electrónico, já que ambos participámos no
> processo
> de formação do Goodeid Working Group ( GWG ).
>
>
>
> Notas finais
>
> . Agradeço, em primeiro lugar, ao colega Kevin van Dijk por me ter chamado
> a
> atenção para o respectivo sítio http://www.endlers.nl/, no qual tomei
> conhecimento com a população Puerto la Cruz e as ligações acima descritas.
>
> . Chamo a vossa atenção para a dificuldade que é distinguir todas estas
> diferentes populações e classes " à vista desarmada ", nomeadamente sem uma
> foto com a ampliação necessária.
>
> . Aconselho-vos a terem o maior cuidado com as abundantes fraudes de
> pessoas
> que comercializam " gato por lebre " insinuando que estão a vender Endler,
> ou melhor, peixes classificados como " P " ou mesmo " N ", quando na
> realidade não passam de híbridos ( " K " ) geralmente produzidos em
> cativeiro.
>
> . Alerto para a possibilidade de existirem já populações de Endler,
> nomeadamente classe K ( híbridos ) em vários locais do mundo, nomeadamente
> em lagos públicos.
> O nosso colega Felipe Aoki teve o cuidado e amabilidade de me enviar umas
> fotos que ilustravam, segundo ele, um " Guppy " diferente, para que eu lhe
> desse o meu parecer sobre a respectiva identificação.
> Na minha óptica tratava-se de um perfeito Cumaná classe K, o qual, segundo
> o
> autor das fotos, estará mesmo já disseminado num corpo de água da sua
> região, no Estado de São Paulo.
> Outro aquariofilista, com base nas mesmas fotos do colega Felipe Aoki,
> pediu-me igualmente a opinião, pois o mesmo peixe estará a supostamente a
> ser vendido como um Endler " puro " ( classe P ou N ? ), por um
> aquariofilista de São Paulo com " olho para o negócio " mas poucos
> escrúpulos... o que só veio dar crédito à minha identificação com base nas
> referidas imagens enviadas originalmente pelo Felipe.
>
> . Espero que tenham compreendido a minha teoria e em particular porque é
> tão
> fácil assistirmos a uma autêntica guerra de palavras, algumas vezes
> extremamente violentas e a primarem pela má educação, sobre este polémico
> peixe.
>
>
> Em conclusão... seja como for, por favor nunca, mas nunca, juntem nenhum
> Endler com Guppy.
>
>
> Um abraço a todos
>
> Miguel Andrade
>
>
> _______________________________________________
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> http://viviparos.com/cgi-bin/mailman/listinfo/cyprinodontiformes
>
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