Cyprinodontiformes vivíparos e ovovivíparos

Livebearer Cyprinodontiformes

Artigos - O Centro Genético de Linhagens de Xiphophorus

Articles - The Xiphophorus Genetic Stock Center

O Centro Genético de Linhagens de Xiphophorus - ( tal como o podemos conhecer em http://www.xiphophorus.org/ )

publicado neste sítio em Junho de 2007 ( tradução para Português do texto original em Inglês )

O que são Xiphophorus ?

Xiphophorus é a denominação de um género composto actualmente por 23 espécies.

Estes peixes são originários de bacias hidrográficas que se descem das montanhas em direcção ao Oceano Atlântico no México, Guatemala, Belize e Honduras, ainda que a maioria das espécies descritas sejam sobretudo encontradas apenas em rios Mexicanos.

Os componentes deste género podem ser divididos em 3 grandes grupos, a saber; os Caudas-de-Espada do Norte, os Cauda-de-Espada do Sul e os Platies.

Se estes nomes comuns lhe dizem alguma coisa é provável que já tenha visto alguns destes peixes em lojas de animais de estimação, uma vez que algumas destas espécies são casos de extrema popularidade na aquariofilia.

Nos anos da década de 1920, descobriu-se que era relativamente fácil conseguirem-se híbridos entre as diferentes espécies.

A característica mais notável e invulgar destes híbridos é o facto de serem férteis e subsequentemente serem capazes de produzirem a sua própria descendência.

Em alguns casos basta colocar-se num mesmo aquário peixes de duas espécies de sexos diferentes para que daí resultem cruzamentos espontâneos.

Em muitas das situações em que a hibridação ocorre, a descendência apresenta características comuns às espécies que estão na sua origem, conservando contudo traços fisionómicos intermédios.

A título de exemplo ilustrativo podemos ter em consideração que os padrões de pigmentação das duas espécies que estão na origem de um determinado híbrido, serão visíveis na geração seguinte ( F1 ), fazendo-os herdar as características de ambos os progenitores.

Casos há no entanto, casos em que o contrário acontece e os híbridos são completamente diferentes dos seus progenitores, desenvolvendo então mutações de cores mais intensas como o vermelho ou o amarelo. Nessas situações em particular, a nova pigmentação deriva de um dos progenitores pois, apesar de não se manifestarem dentro da própria espécie,  são evidenciados na respectiva descendência híbrida.

Cientistas nos Estados Unidos da América e na Alemanha, descobriram que alguns destes híbridos desenvolviam muito facilmente melanomas, um dos mais mortíferos cancros da pele.

Estes melanomas resultam de padrões cromáticos melanísticos irregulares.

Imediatamente se começaram a estudar estes híbridos em particular, uma vez que os investigadores tomaram consciência que tinham descoberto um modelo animal que se poderia revelar extremamente útil na pesquisa sobre o cancro.

Actualmente continua-se a usar híbridos resultantes dos cruzamentos entre espécies do género Xiphophorus, particularmente os que são mais propensos ao desenvolvimento de melanomas.

Este é um trabalho que teve início na década de 1920 e tem vindo a prosseguir ao longo de todos estes anos.

Introdução

 
Os bancos de estoques genéticos são preciosos recursos de inestimável valor para a investigação científica.

As pesquisas e estudos com genes requerem usualmente linhagens " puras " de animais ou plantas, a fim de permitirem resultados que possam ser reproduzidos em qualquer laboratório do mundo, para além de permitirem, nomeadamente, a ausência de divergências em função de factores ambientais ou especificamente em virtude das variações aleatórias encontradas nas várias populações.

Para se obterem animais geneticamente muito idênticos entre os vertebrados é vulgarmente  encorajada uma endogamia forçada, utilizando-se como progenitores os próprios irmãos. Dessa forma,  teoricamente, em cada nova geração quase metade da diversidade genética dos progenitores é perdida.

Para muitos de nós é uma grande surpresa apercebermo-nos que uma das mais antigas linhagens genéticas preservadas para fins científicos é constituída por peixes ovovivíparos do género Xiphophorus, os quais são vulgaríssimos e abundantes na aquariofilia.

Na década de 1920, o biólogo Norte Americano Dr. Myron Gordon e os biólogos Alemães Haussler e Kosswig descobrem, de forma autónoma uns dos outros, que os híbridos entre uma variedade específica de Platy - Xiphophorus maculatus e Cauda-de-Espada - Xiphophorus helleri eram muito propensos a desenvolver uma forma de cancro virtualmente igual aos melanomas que se desenvolvem no organismo humano.

Conseguiram mesmo identificar a origem destes tumores numa ou noutra determinada linhagem em particular.

Esses cientistas acabariam por descobrir que os tumores eram originados em células de pigmentação encontradas num determinado padrão de uma população de Platy que exibia uma mancha negra na barbatana dorsal.

As investigações demonstraram igualmente que os melanomas se desenvolviam apenas em híbridos em que um gene regulador proveniente dos Platies era substituído pela herança genética dos Cauda-de-Espada, os quais não possuíam defesas para controlarem a proliferação das células de pigmentação da outra espécie parental.

Este animal resultante do cruzamento entre as duas espécies, foi o primeiro a provar que alguns cancros podem ser de origem genética. Por essa razão, 65 anos depois, estes peixinhos continuam a ser usados na pesquisa sobre o cancro, nomeadamente nos Estados Unidos, Alemanha e Japão.

O Dr. Gordon apercebeu-se que para se identificar com precisão os genes responsáveis pelo desenvolvimento de tumores cancerígenos, era essencial dispor de peixes das duas espécies geneticamente muito idênticos aos das investigações iniciais. Em virtude dessa necessidade, desenvolveu esforços para a criação do Centro Genético de Linhagem de Xiphophorus ( “ Xiphophorus Genetic Stock Centre “ ), cujas primeiras instalações foram no Museu Americano de História Natural e no Aquário de Nova Iorque, onde ficariam situadas até 1993, altura em que se deu por concluída a transferência para as actuais instalações na Universidade do Texas em São Marcos.

Durante sensivelmente 55 anos, o Centro foi dirigido pelo próprio Dr. Gordon juntamente com os seus colegas Dr. Klaus e Dr. Kalman.

Actualmente, na Universidade do Texas, o seu Director é o Dr. Ronald Walter.

Algumas das linhagens iniciadas na década de 1930 pelo Dr. Gordon continuam disponíveis ainda hoje com uma pureza genética tal que são quase virtuais clones. Nalguns casos o seu graus de endogamia é muito elevado pois resultam de acasalamentos entre irmãos ao longo de mais de 80 gerações.

Quando o Dr. Gordon iniciou os seus primeiros estudos e investigação genética, incluindo o trabalho de campo no México e América Central, apenas uma meia dúzia de espécies do género Xiphophorus era reconhecida pela ciência na altura.

Actualmente 23 espécies fazem parte deste género e estão descritas cientificamente.

São mantidos no Centro “ populações ” de todas elas, excepto de uma.

Entretanto os trabalhos de campo prosseguem actualmente, em particular aqueles que são dirigidos pelo Dr. Kallman e pelo Dr. Morizot.

Ainda hoje se continuam a descobrir novas espécies na natureza de tempos a tempos, pelo que a preservação dos recursos genéticos deste género assumem cada vez mais importância e valor, tornando crítica a sua preservação.

Existem cerca de 8 destas espécies do género Xiphophorus que estão confinadas a localizações geográficas muito restritas e zonas potencialmente ameaçada devido à destruição do habitat causada pelas actividades humanas.

Uma destas espécies está considerada como ameaçada e uma outra revelou-se recentemente como extinta.

O Centro de Linhagens Xiphophorus, ao fornecer peixes para a comunidade científica internacional, está a contribuir para a diminuição da pressão sobre as populações naturais e será sem dúvida um indispensável recurso de preservação, pois actualmente possui os últimos representantes vivos de algumas espécies que já se encontram extintas na natureza.

Tal como os métodos de conservação das espécies evoluíram muito desde a sua criação, a investigação científica também deu um grande passo em frente, pelo que as estratégias de reprodução no Centro actualmente procuram evitar os efeitos nefastos da endogamia, excepto em linhagem muito particulares, procurando dessa forma obter a maior viabilidade genética das populações conservadas, particularmente nas mais recentes linhagens ou espécies conservadas.

Serviços proporcionados pelo Centro Genético de Linhagens

O Centro dispõe da mais de 70 linhagens para fornecer aos cientistas e aquariofilistas em todo o mundo.

Mais de 30 laboratórios ou institutos de pesquisa científica situados nos Estados Unidos da América, Canadá, México, Japão e Alemanha, trabalham com peixes do género Xiphophorus especificamente com linhagens provenientes do estoque existente actualmente.

Para além de facultar o fornecimento de peixes e consultoria em reprodução e genética sobre os mesmos, são proporcionados híbridos concebidos especificamente para determinados projectos científicos, o que perfaz um total de largas centenas de peixes comercializados todos os anos, mas ainda assim fornecidos a um custo razoável.

Ao contrário do que acontece com os mamíferos, nos quais é impossível ou difícil obterem-se híbridos, entre muitas espécies de peixes do género Xiphophorus os cruzamentos resultam muito bem e produzem-se com facilidade até peixes férteis. Muitos destes animais híbridos provaram já o seu valor inquestionável como instrumentos de trabalho na pesquisa científica, particularmente na investigação sobre o cancro.

Um apurado e extensivo trabalho sobre a genética do género Xiphophorus tornou o mapa de genes destas espécies e seus híbridos conhecidos como o quinto mais bem estudado e catalogado do nosso conhecimento actual, ultrapassando a informação obtido sobre mamíferos como o homem, o rato, ou a vaca, espécies sobre as quais já existe o maior número de genes conhecidos pela ciência.

Aliado a tudo isto, a beleza de algumas espécies ou variedades têm vindo a apaixonar os aficionados pela aquariofilia ao longo de décadas.

A procura por parte dos especialistas em relação a peixes como o Xiphophorus montezumae, ( o qual possui uma espada maior do que o resto do corpo ), excede largamente a capacidade de produção de indivíduos no Centro, contudo, na medida do possível, vão sendo mesmo assim disponibilizados exemplares excedentários para os aquariofilistas quando isso é realizável.

As actuais instalações albergam cerca de 1200 aquários, dos quais 900 se destinam à conservação de linhagens e 300 se destinam à produção de híbridos para projectos de investigação. Embora este número possa parecer desmedido, cada nova espécie recolhida no seu habitat ou nova linhagem genética exige o repensar da gestão dos recursos existentes.

O controle de qualidade num centro desta natureza deve ser irrepreensível, principalmente para a manutenção da integridade genética das linhagens, ( um único peixe “ clandestino “ ou um “ acrobata que conseguisse saltar de um aquário para o outro, seria um desastre para a incorruptibilidade ou pureza do estoque onde conseguisse infiltrar-se ).

Algumas linhagens produziram variedades que foram propositadamente seleccionadas por possuírem algumas características morfológicas como os padrões específicos com pigmentos pretos ou vermelhos.

Cada uma destas linhagens possui uma combinação genética única, como se fosse uma espécie de “ assinatura “ particular, a qual pode ser sempre que necessário confirmada para a aferição da pureza do estoque.

As ninhadas de cada fêmea nunca são misturadas e os peixinhos são separados antes de atingirem a maturidade sexual em grupos compostos apenas por indivíduos do mesmo sexo. Os progenitores de cada ninhada são preservados para alguma possível referência futura ou para poderem ser respondidas eventuais dúvidas.

Todos estes procedimentos exigem um esforço tempo consideráveis, contudo são incontornáveis na manutenção da integridade das linhagens por mais de 50 anos.

As “ Estrelas “ do Centro de Linhagens Genéticas

Cada uma das cerca de 70 linhagens de Platies e Caudas-de-Espada possuem uma característica especial que a distingue das restantes, seja por serem os representantes ( muitas vezes os últimos ) da sua espécie, por serem portadores de genes que lhes criam susceptibilidade a uma determinada forma de cancro específica ou ainda por produzirem descendência composta apenas por machos ou apenas composta por fêmeas quando cruzados com determinada espécie ou híbrido. Apenas uma ínfima parte pode ser ilustrada por fotografia no sítio e as imagens existentes apenas se destinam a honrar a extraordinária sucessão de peixes que compõem hoje a investigação genética através do género Xiphophorus e a extraordinária variedade de espécies encontradas na natureza.

Por alguma singularidade destacam-se no entanto as seguintes :
 

Xiphophorus maculatus, população Jp, do Rio Jamapa, Veracruz, México.

Algumas das linhagens desta proveniência ( designadas por Jp ) descendem directamente de antepassados recolhidos na natureza pelo Dr. Gordon em 1939.

Duas sub linhagens, Jp 163 A e Jp 163 B, são descendentes de uma única fêmea e foram submetidas a uma intensa endogamia durante mais de 85 gerações.

As fêmeas destas linhagens caracterizam-se por possuírem a barbatana dorsal com marcas negras, um padrão típico no flanco em forma de falso olho, características estas que são transmitidas por cromossomas “ X “, enquanto os machos apresentam listas laterais e genes de barbatana anal nos seus cromossomas “ Y “.

Os híbridos resultantes dos cruzamentos destas linhagens com Caudas-de-Espada são extremamente propensos a desenvolverem o melanoma. No caso da linhagem Jp 163 A são os pigmentos da dorsal do Platy que estão na causa do desenvolvimento cancerígeno nos híbridos, enquanto na linhagem Jp 163 B as manchas laterais desenvolvem os melanomas muito rapidamente após uma exposição breve à luz ultravioleta.

Outras linhagens Jp incluem uma mais recentemente capturada na natureza sem marcas mas de uma coloração natural azul iridescente.

As mais antigas destas estirpes fazem parte da investigação sobre o cancro há mais de 50 anos.

Xiphophorus helleri, população Cd, do Rio Jamapa, Veracruz, México.

O magnífico Cauda-de-Espada da linhagem Cd é o mais antigo conservado no Centro.

Estes peixes descendem de antepassados colhidos na natureza em 1930 mas, dado que os Caudas-de-Espada maturam mais tarde do que os Platies, esta linhagem vai em pouco mais do que a respectiva 50ª geração.

Os genes que controlam os seus excepcionais tons em vermelho, amarelo e verde continuam ainda desconhecidos, mas as variedades com espada laranja ou mesmo verde estão identificadas com um único cromossoma “ Y “.

A particularidade da linhagem Cd é a ocorrência de tempos a tempos, em algumas gerações apenas, de ninhadas compostas única e exclusivamente só por machos ou só por fêmeas, o que se torna uma fonte de constante ansiedade durante a sua manutenção.

Ainda não foi identificada nenhuma causa para esta particularidade anormal nesta estirpe completamente intacta e inalterada.

Xiphophorus multilineatus, Rio Coy, San Luis Potosi, México.

Algumas notáveis e interessantes descobertas científicas em termos de ecologia, comportamento animal e genética resultaram de estudos com esta espécie.

Um polimorfismo sexual evidente, relacionado com uma hormona sexual controlada por um determinado gene, faz com que existam quatro tipos de machos diferentes, particularmente em relação ao tamanho máximo no estádio adulto e ao período de maturação sexual; de 6 a 9 meses para os pequenos machos dourados, a mais de 1 ano para os grandes machos azuis.

Estudos sobre o comportamento demonstraram que as fêmeas têm preferência pelos grandes machos azuis, os quais praticam elaborados rituais de galanteio, enquanto os pequenos machos amarelos se aproveitam da distracção das fêmeas para acasalamentos furtivos.

Este tipo de polimorfismo ocorre não só no complexo Xiphophorus multilineatus mas igualmente noutras espécies do género.

Esta é mais uma daquelas espécies que evoluíram num sistema hidrográfico muito restrito o que os coloca em risco de sobrevivência quando ameaçados pela destruição do habitat.

Xiphophorus montzumae, Ribeira de Rascón, Rio Gallinas, San Luis Potosi, México.

Durante muito tempo, a espécie vulgarmente conhecida na aquariofilia como Cauda-de-Espada Montezuma era na verdade uma espécie aparentada com uma espada mais reduzida e o corpo mais curto, cuja verdadeira designação científica é na realidade Xiphophorus nezahualcoyotl.

O verdadeiro Espada de Montezuma foi redescoberto pelos Directores do Centro na década de 1980.

Daí para cá tem-se tornado uma preciosidade entre os aquriofilistas, nomeadamente devido à sua espada espectacularmente longa ( maior do que o próprio corpo ).

Ao contrário de outras espécies mais aparentadas, as pintas pretas encontradas nos exemplares de Xiphophorus montzumae não são transmitidas através de um gene ligado ao sexo e não conduzem a células pigmentadas propensas ao cancro nos respectivos híbridos.

Contribuições originais em língua Inglesa de Donald C. Morizot, Steven Kazianis e Jay Kumar ( Centro Genético de Linhagens de Xiphophorus )

Informação adicional : Para se conhecer a história do Centro Genético de Linhagens de Xiphophorus, aconselhamos a leitura de um artigo ( em Inglês ) através da ligação - http://www.xiphophorus.org/100300s6/css/100300s6_1.htm

Solicitações para a obtenção de peixes vivos do género Xiphophorus ou para questões relacionadas com Centro Genético de Linhagens, a sua actividade ou os seus serviços, pode-se enviar uma mensagem ao cuidado do respectivo Director através dos seguintes contactos :

Dr. Ronald Walter ( rw12@swt.edu )

The Xiphophorus Genetic Stock Center

Texas State University

San Marcos

601 University Drive

419 Centennial Hall

San Marcos TX 78666-4616

Phone: (512) 245-0357

Bibliografia aconselhada :

Anders et al., 1981. Tumor Gene Expression and Interphase Chromatin Appearance in Xiphophorus.
Amer. Zool.1981; 21: 535-548.

Ronald B. Walter and Steven Kazianis, Xiphophorus Interspecies Hybrids as Genetic Models of Induced Neoplasia.

ILAR Journal ISSN 1084-2020, 2001; Volume 42, Number 4.

http://dels.nas.edu/ilar_n/ilarjournal/42_4/xiphophorus.pdf

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